
O velho Kalidar estava com vários documentos entre as patas. Ele os estudava, examinava detalhadamente e relia, muitas e muitas vezes, passando com frenesia de um para o outro, com uma expressão concentrada. Ou aborrecida? É difícil saber. Ele coçava o focinho com suas grandes patas cobertas de cicatrizes. À sua frente, um Álmata fracote, com os ombros caídos e o focinho para baixo, não parecia muito seguro de si.
"Hum..."
No espaço de uns dez minutos, que pareceram intermináveis para o jovem candidato, foi o único som que saiu da boca do intimidante personagem canino. A atmosfera estava pesada.
"Hum..."
Quando o Álmata ameaçou pegar no sono, um rosnado de Kalidar o acordou com um susto.
"Na cozinha! É o máximo que posso lhe oferecer, meu chapa. Trate de dar o melhor de si, pois nossos soldados vão precisar de muita força!"
Ao mesmo tempo decepcionado com o veredito e aliviado que o suplício tivesse finalmente terminado, o jovem Kilorf pegou suas trouxas e foi embora sem ladrar.
"Hunf, esses guerreiros de araque... É de VERDADEIROS GUERREIROS que eu preciso, e não de confeiteiros!", rosnou o Kilorf, batendo o punho na mesa.
"PRÓXIMO", gritou ele em seguida, limpando os dentes com um ossinho de Miaw.
Dois Kilorfs, um macho e uma fêmea, vestidos como se fossem dançar no Baile do Início dos Tempos, aproximaram-se rebolando, com um sorriso rebelde e sedutor nos beiços. Kalidar os observou com estupefação, franzindo a testa e deixando-a mais enrugada que um shar pei, depois deu a maior gargalhada, fazendo a tenda de sua cabana vibrar.
"Ha ha ha ha! Vocês acham que estão em uma festa de premiação da The Bardo Factor ou o quê?! Ninguém merece! Ha ha ha!"
Nobie e Klaide pareciam não estar nem aí para os comentários do molosso. Impassíveis, eles continuavam exibindo um sorrisinho satisfeito. Os dois Bermans de guarda, que até então não tinham se mexido, estavam penando para segurar o riso, mal conseguindo impedir seus ombros de darem pequenos sobressaltos.
"Não, sério, gente – disse Kalidar, novamente circunspecto. Vocês erraram o lugar, aqui não tem festa chique nenhuma. Andem, caiam fora, não temos tempo a perder. PRÓXIMO!"
Os dois comparsas se aproximaram um pouco mais. O macho tomou lugar na cadeira em frente a Kalidar e se esparramou confortavelmente, fitando o Kilorf no fundo dos olhos. A fêmea se sentou na beira da mesa e cruzou as pernas, revelando através da fenda de seu vestido comprido atributos cheios de charme...
Kalidar perdeu a paciência. Arreganhou os beiços, mostrando uma bela fileira de caninos brilhantes e afiados. Um leve rosnado escapou de sua garganta. Os Bermans também não estavam mais rindo. Um deles foi em direção aos dois inconvenientes intrusos, apontando sua lança para ameaçá-los.
"E aí, seus patetas, vocês não ouviram o chefe? Não temos tempo a perder com idiotas como vocês. Este é o serviço de recrutamento para acabar com a raça do Ogrest, não estamos aqui para comer canapezinhos de Cogu Cogu nem bater papo em torno de taças de champanhe! Fui claro?"
"Que gracinha isso", disse Nobie, inclinando-se na direção de Kalidar e tentando tocar no colar de ossos que enfeitava o pescoço do gigantesco canídeo.
Como bom guarda-costas, o Berman partiu para cima dela imediatamente. Mas não rápido o bastante: Nobie rasgou seu vestido com um único gesto, revelando um traje de guerreira. Então tirou de suas costas um gancho esculpido em um enorme osso e o lançou em direção à armação da tenda, depois se apoiou na mesa para executar uma pirueta que terminou com um belo pontapé no queixo do guarda.
O segundo Berman, por sua vez, tentou agarrá-la, mas foi interrompido por Klaide, que o imobilizou com uma hábil chave de braço e depois lhe deu um furioso chute nas costas. O Berman foi projetado para a frente e terminou seu voo rasante em um armário cheio de instrumentos e armas de guerra de todo tipo, levando consigo alguns outros soldados que estavam no caminho e provocando uma barulheira ensurdecedora.
Os golpes vinham de todo lado, mas Nobie e Klaide os evitavam com a maior classe e elegância. Eles deram um baile em seus adversários, botando-os para correr freneticamente, como se estivessem seguindo uma coreografia aprendida de cor. Pareciam dois dançarinos profissionais, tão elegantes quanto perigosos!
Após meia hora de uma baita pancadaria, o eco dos golpes, das armas se chocando e dos gritos se atenuaram, dando lugar aos lamentos dos soldados estatelados no chão. Nobie e Klaide, por sua vez, estavam ilesos. Ela estava com o pé apoiado nas costas de um Kilorf visivelmente desmaiado, de olho inchado feito um ovo de Truz e língua para fora. Ele mantinha firmemente o pescoço de um soldado com um mata-leão e segurava o colar de Kalidar na outra mão.
"Tome, querida", disse ele a Nobie , entregando-lhe a joia.
"Você é um amor, meu anjo...", agradeceu ela de forma afetada, soprando um beijo com a mão em seguida.
O acampamento parecia um verdadeiro campo de batalha. Sozinhos, Nobie e Klaide tinham conseguido derrubar a maioria dos homens de Kalidar. Os outros simplesmente não ousavam nem mexer o rabo, petrificados de medo depois do que tinham acabado de presenciar.
Impressionado, Kalidar também tinha permanecido paralisado feito uma estátua ao longo de todo o "espetáculo". Os dois guerreiros se aproximaram lentamente, enquanto ele ia se abaixando cada vez mais em sua poltrona, como se quisesse ficar inatingível.
"E aí? Contratados?", perguntou Nobie, enquanto Klaide devolvia o colar a Kalidar.
Quer saber mais sobre os Kilorfs? Encontro marcado no próximo número de Gamakna!